Impressões: João Rock não inova, mas agrada público

Segundo a organização, o festival João Rock reuniu cerca de 35 mil pessoas no último sábado (31), no Parque Permanente de Exposições, em Ribeirão Preto
Tempo de leitura:14 minutos

Por Analídia Ferri e Francine Micheli
Fotos e vídeos: Allan Nogueira, Analídia Ferri e Paulo Gallo

O festival João Rock, que aconteceu em Ribeirão Preto no último sábado (31), reuniu cerca de 35 mil pessoas (segundo a organização) no Parque Permanente de Exposições. O Varal Diverso esteve lá, acompanhou alguns shows e conta para vocês alguns lances do evento.

Começamos agradecendo a todos que participaram da nosso concurso cultural. Dois sortudos e criativos faturaram um par de convites cada para assistir ao João Rock e, de brinde, dar uma volta pelo backstage do festival. Os vencedores foram Renan Gomes e Ariane Dias:

Zé Ramalho iniciou os trabalhos sob um pôr-do-sol desses típicos de inverno. Com o céu dégradé, cantou a primeira da noite, "Pra não dizer que não falei das flores", de Geraldo Vandré, e seguiu com "Batendo na porta do céu", "Beira-mar" e "Táxi lunar".

Como sempre, o cantor escolheu a dedo os seus maiores sucessos; entre eles, "Admirável gado novo", "Chão de giz" e "Avohai", um belo repeteco do seu último show no João Rock, em 2011. Só que dessa vez, Zé Ramalho estava empolgado e interagiu mais com o público. Na sua outra passagem, no Palco Universitário, o cantor reclamou muito do som.

A noite estava apenas começando quando CPM 22 subiu ao palco João Rock — desta vez, em versão acústica. Fãs de carteirinha e recordistas de participação no João Rock, a banda relembrou vários sucessos, entre eles, "Desconfio", "Não sei viver sem ter você", "Irreversível", "1 minuto para o fim do mundo", "Regina Let's Go", entre outros. Outra repetição que agrada a maior parte do público.

Nando Reis assumiu o palco em seguida para mostrar sua nova fase “cara limpa”. Nando trouxe os filhos e cantou com eles no palco. Bem mais sereno, o cantor agradou o público com suas canções mais românticas: "Sou dela", "O que eu só vejo em você", "Pra você guardei o amor", "Por onde andei", "Do seu lado" e "Luz dos Olhos", todas acompanhadas por um coro de milhares de pessoas. Era mesmo outro Nando, completamente diferente daquele que se apresentou no mesmo palco em 2013. Até a voz soava mais leve.

Na sequência, O Rappa — banda recordista no João Rock, com 8 apresentações — chegava para causar a polêmica que repercutiria no dia seguinte. "O Horizonte é logo ali" abriu o show, seguida de "Auto-Reverse" e "Monstro invisível". Depois vieram "Mar de gente" e "Lado A, Lado B", e o que poderia parecer um grande show, fugiu do seu propósito. Falcão destilou suas críticas ao governo de Dilma Rousseff, comparou os aeroportos do Brasil com os da Jamaica e disse ser contra a Copa do Mundo.

“O legado que tem da Copa é um legado muito escroto e pequinininho, muito nada a ver”. Falcão é interrompido por alguém da banda que o alerta sobre o tempo que resta do show. “Faltam 20 minutos. Eu vim aqui pra tocar. A galera não é mais boba. Como diz meu amigo Romário: 'ninguém está de bobeira, tá todo mundo ligado'. E só tem dois tipos de Copa: a que vencer e a eleição que vem logo depois. A gente não pode esquecer disso, hein?” diz.

O tempo do show corria e Falcão continuava. “A gente ama o futebol, mas pela primeira vez a gente tem que ser honesto”. Nesse momento, o público inicia o coro “Ei, Dilma, vai tomar no…”. Falcão emenda: “Você viu que eu jamais falaria isso! Mas o desabafo não é meu não, é de vocês, é nosso, é de todo mundo”. E em seguida continua com outros comentários dispensáveis.

Falcão deu uma de Dinho Ouro Preto que adora uma falácia: desperdiçou tempo de show e palavras. Disse algumas coisas em um momento inoportuno. O show d’O Rappa continuou com mais do mesmo, com o repertório de sucessos da banda, e quando chegou no final, Falcão quis cantar mais uma música, mas foi impedido pela produção. Saíram rapidamente do palco, com aquela sensação de que ainda faltava alguma coisa.

Um breve intervalo e uma das bandas mais esperadas da noite assimiu o som: Os Paralamas do Sucesso. O ar era de expectativa, uma vez que a banda havia tocado no festival em 2003, com Herbert Vianna recém-recuperado do acidente. Aquele foi um show memorável! Nesse, um telão recontava a história dos 30 anos de existência da banda, as imagens como a de Herbert deixando o hospital de cadeira de rodas são inesquecíveis.

Os Paralamas invadiram o palco e já iniciaram os primeiros acordes de "Alagados". E a sequência foi só de sucessos, daqueles inesquecíveis: "Uma brasileira", "Loirinha Bombril", "Cuide bem do seu amor", "Meu erro", "Óculos", "Vital e sua moto", "Lanterna dos afogados" e "Ela disse adeus" e outras tantas músicas atemporais. Destaque também para a música "Quase um segundo", raramente apresentada ao vivo.

Os Paralamas encerraram o show com a clássica "Que país é esse?". Um grande show de uma banda impecável e tão intensa que os acordes penetravam nos ouvidos e dava até uma certa nostalgia de vê-los ali, tão perfeitos, apesar dos anos.

Em seguida, Jorge Ben Jor ressurge 5 anos depois de cantar naquele mesmo palco, com uma energia de dar inveja. Em pouco mais de uma hora, Jorge cantou um repertório de cerca de 30 músicas e, o mais incrível, é que mal parou para respirar: parecia um eterno pot-pourri de seus maiores sucessos. "Jorge da Capadócia", "Que pena", "Que maravilha", "Quero toda noite", "O telefone tocou novamente", "Menina mulher da pele preta", "Taj Mahal", "Fio Maravilha", "Ive Brussel", e muitas outras. Como dizem, um show The best of, digno de chamar a atenção por estar ali, firme e forte, depois de cancelar uma sequência de shows no começo do ano, por problemas de saúde.

A última banda a se apresentar foi a Nação Zumbi, muito aguardada pelo público sobrevivente das quase 10 horas ininterruptas de shows. Jorge du Peixe, Lúcio Maia e companhia surgiram no palco ao som de "Quando a maré encher". No único encontro do João Rock, o paralama João Barone participou da percussão nas clássicas "Manguetown", "Blunt of Judah" e "Meu maracatu pesa uma tonelada".

A banda também incluiu no repertório músicas de seu disco mais recente, como "Defeito perfeito", "Foi de amor" e o novo hit "Cicatriz". Para fechar, os hinos "Rio, pontes & overdrives" e "Da lama ao caos".

Palco Universitário

Vanguart foi a primeira banda a passar pelo palco alternativo. Queridinhos em Ribeirão, a banda teve a oportunidade de mostrar um show mais “rock” do que o normal — como havia prometido Helio Flanders em entrevista ao Varal Diverso.

O repertório teve músicas do disco mais recente da banda, Muito mais que o amor (2013), como "Meu Sol", "Eu sei onde você está" e "Pelo amor do amor" e outras mais conhecidas dos fã, como "Cachaça" e "Mi vida eres tu". Por fim, para encerrar e relembrar o começo da banda, “Semáforo”, cantada por um coro a plenos pulmões.

Pisando pela primeira vez em Ribeirão, as Vespas Mandarinas mostraram ao que vieram. Enquanto o público gritava "Raimundos! Raimundos!" eles, humildemente, cumpriram sua obrigação. Fizeram um bom papel, especialmente quando Chuck Hipólito, ex-VJ da MTV, prova que sabe dominar o palco, mesmo com o esterótipo cool-hype-colorido-queria-morar-em-Londres trouxesse mil pré-julgamentos.

O rock das mandarinas é bacana sim. Um pouco mais para os que ainda não fizeram 21 anos. Um pouco menos pra quem estava ali esperando por Digão, Canisso e companhia.

Com quase uma hora de atraso, os primeiros acordes dos Raimundos foram verdadeiras pedradas na cabeça. Quem ali tinha mais de 30, se sentiu um fervoroso adolescente cantando as bobagentas "O pão da minha prima" e "Esporrei na manivela". O momento whatafuck da noite aconteceu quando Digão tocou e cantou sozinho metade de "Será", da Legião Urbana. Dava pra ver um desconforto na plateia.

Mas logo se abriu um espaço no meio do público, desafiado por Digão a promover a maior roda de todos os tempos. A terra que subiu sobre as nossas cabeças anunciava que o desafio tinha sido cumprido. E com louvor!

Para terminar, uma homenagem a Chorão e Champignon, do Charlie Brown Jr., animou todo mundo ali: "Zóio de Lula" só não podia ficar pra depois de "Puteiro em João Pessoa", que excluiu machistas e feministas, dando lugar a meninos e meninas grandes que pulavam felizes e lembravam de uma época boa da sua vida. E foi assim que terminou o show mais emblemático do João Rock 2014.

Uma das maiores reclamações que ouvimos do público foi que os shows foram curtos, alguns com menos de uma hora, por conta da transmissão ao vivo feita pela Multishow. Essa é uma dinâmica de muitos festivais. 

O que também não agradou o público foi colocarem a banda Raimundos para tocar no Palco Universitário e praticamente ao mesmo tempo que Nação Zumbi, que se apresentava no Palco Principal. O público ficou bastante dividido, mas o Varal Diverso já havia adiantado que Raimundos voltaria para tocar em Ribeirão em um show gratuito, no próximo dia 21/06 (ainda sem local definido), dentro da programação do “24 Horas de Arte”, evento da Prefeitura Municipal. Fica a chance para quem não viu e a oportunidade de rever.

Apesar de não inovar e repetir a receita trazendo quase sempre as mesmas bandas, o João Rock mostra que ganha mais respeito a cada edição, embora ainda necessite de ajustes na organização — como em todo grande evento. Uma boa curadoria para a escolha dos próximos shows pode trazer uma melhora significativa para o festival durar por um longo tempo.

Quando as luzes se apagam e a música acaba, saímos do festival com aquela sensação de que só o João Rock pode proporcionar a milhares de pessoas de Ribeirão e região, um encontro tão importante para a música nacional, ao contrário de outros grandes festivais que vemos por aí — mas que também têm seu valor.

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