Por Francine Micheli
Fotos: Allan Nogueira
Provavelmente você nunca ouviu falar ou sequer tenha imaginado que isso poderia existir, quanto menos aqui, bem em Ribeirão Preto. Mas a única miniferrovia do Brasil está logo ali, na Lagoinha, há 12 anos, esperando pelo público que quase nunca chega.
Sob comando do metalúrgico aposentado, José Leonel Damasceno Filho, de 52 anos, os trilhos com 800 metros de extensão se juntam às quatro miniestações para fazer o cenário perfeito das pequenas locomotivas. Tudo foi construído por Léo, como é conhecido, sob uma escala de 1: 10.
A estrutura permanente recebe visitas apenas aos domingos, quando são oferecidas viagens no trem ao preço simbólico de R$ 5. “Aqui não existe trenzinho, casinha, trilhinho. É uma ferrovia de verdade, com tudo, só que em escala pequena. Explico tudo certinho para que não confundam com ferromodelismo ou ainda com esses trenzinhos de festa infantil”, esclarece Leo.
A miniferrovia conta com quatro estações (a Mogiana, a Lagoinha, a Ribeirão Preto e a da Paz — em homenagem à praça), três pontes (ponte David Brito, ponte José Leonel Damasceno e ponte Antonio Zanotti), cinco pontilhões e uma oficina de manutenção. Lá são feitos os ajustes e é onde ficam guardadas as locomotivas.
Durante as “viagens”, os passageiros aprendem sobre cultura ferroviária no Brasil, o que dá ao projeto uma característica ainda mais educativa.
O preço do sonho
Apesar de muitos acharem que trata-se de um hobby, a FerrLeo é uma empresa como outra qualquer e recusa todo tipo de apoio público. A renda vem da venda das passagens e dos espaços publicitários vendidos nos vagões do trem de carga. Quando visitamos a ferrovia no último domingo, Dia das Mães, ninguém havia aparecido.
“Sou registrado como micro empreendedor individual e a FerrLeo é um negócio como outro qualquer”, diz. “Meu objetivo é levar cultura à população, mas pouca gente sabe da existência dessa ferrovia”, lamenta Leo, que vive com uma aposentadoria que não chega aos R$ 2.000.
Segundo ele, uma locomotiva custa quase R$ 15.000 para ser construída e leva quatro anos para ficar pronta. Tudo, até agora, desde a estrutura da ferrovia até a manutenção e limpeza da praça, foi feito com recursos próprios.
Ajuda
Apesar do pouco público, algumas pessoas que conheceram o projeto de Leonel se apaixonaram tanto pela ideia que se tornaram colaboradores. É o caso do mecânico Adriano Oliveira, que vem de Sertãozinho toda semana para ajudar na condução e manutenção há sete anos. “Tinha ouvido falar da ferrovia, mas demorei uns cinco meses para descobrir onde ficava. Comecei a vir para ajudar e nos tornamos grandes amigos”, conta.
De quepe e tênis sujos, Marcos Vinícius de Souza Sarro é um dos maquinistas e está sempre atento aos comandos que Leonel passa pelo rádio. Com apenas 10 anos, desde os 5 vai à Praça da Paz com o pai ajudar na miniferrovia. “Eu já sou um especialista em trens. Você sabe o que significa a sigla TREM? Transporte Rápido Em Massa”.
Quando questionado sobre a possibilidade de ter que deixar a praça, Leonel é enfático e lembra que já recebeu diversas autuações por ocupar um espaço público e que sua requisição para a ocupação está parado no poder público há mais de 10 anos. “Nunca recebi nenhum apoio e nem quero. Isso aqui é uma empresa e se fui eu quem criei, sou eu que tenho que cuidar. Não preciso de nada, só que me deixem oferecer uma opção de cultura para a cidade”.
Atualmente, os espaços para publicidade vendidos nos vagões do trem de carga têm apenas duas empresas clientes. Eles custam R$ 300 com contrato por um ano.
"Tenho consciência de que pouca gente dá importância a tudo isso e sei que a qualquer hora posso parar e desistir. A miniferrovia vai morrer comigo", diz.
A FerrLeo funciona aos domingos, das 8h às 13h, na praça da Paz, que fica localizada entre as ruas Dr. Wlamir de Lima Pupo e Antônio Fernandes Figuerôa, na Lagoinha.